Acho muito curioso como as pessoas nas redes questionam quando reforçamos a pretitude das duas maiores ginastas da atualidade. Dá preguiça de explicar, mas só quem é preto entende a sensação. Brancos estão sempre na frente em termos de direitos e se julgam sujeitos universais. Os incomoda profundamente o recorte de raça e ainda mais quando sentem que estão sendo excluídos da celebração.
“Mas o que cor tem a ver? É uma vitória de todos”. Bom, se uma mina preta periférica como a Rebeca Andrade não tem oportunidade, educação, acaba engravidando, vivendo uma vida miserável pulando em empregos merda, aí o problema é só dela, né?
O Brasil é dependente de heróis. Sempre estamos ávidos a torcer pelos gênios, pelos extraclasse, pelos incríveis. Não gostamos e nem somos ensinados a gostar de esporte em si. É preciso um Senna, um Guga, uma Rebeca, para que possamos desviar os olhos dos jogos horríveis do campeonato brasileiro de futebol e das terríveis várzeas do “futebol raiz”.
Então, quando a lente do mundo olha para o Brasil através das conquistas de mulheres pretas e isso é apontado, começa a animosidade racista e o impulso de desvincular a vitória do recorte de raça.
Ora, Rebeca, Bia Souza, ainda que não sejam agentes políticos ativos, ainda que revelem vocação conservadora e cristã (bem como é boa parte das mulheres pretas brasileiras), ainda serão filhas de um certo tipo de vivência, moldada na ausência de grandes oportunidades, dependendo do escasso apoio e claro, de seus inegáveis talentos e esforços monumentais.
Talvez essas pessoas devam se perguntar a razão de não haver meninas pretas em esportes que dependam de clubes privados destinados à classe média. Aprendemos a dar estrelinha no sofá de casa, derrubar o irmão na rua de terra, mas vela, tênis, natação e suas variações, somente em locais específicos. E por que não estamos lá? Hipócritas! Eles sabem. Só não suportam olhar um pódio de meninas pretas se admirando mutuamente.
Vão nos chamar de identitários, de querer separar. Farsantes! Logo eles, que nos separaram de nossos ancestrais conforme a qualidade de nossos dentes e nossa aptidão para o trabalho forçado.
Se não entendem a alegria alheia por conta de conquista nos esportes, entendam que Olimpíada nasceu para substituir guerras e nos esportes mais populres, temos vencido com ampla vantagem.
Eles não entendem e nem vão.